terça-feira, 23 de agosto de 2011

Lóbulo


Teu resmungar ecoando nas paredes do meu lóbulo
Nina as aves abatidas
Constrói o sono dos tubarões
Consome a sede de homens do viaduto.

Tua face evidenciada pela máscara oriental
Guia os cavalos mancos em direção à desgraça
Teu pulmão, copo quase cheio de pus, deslocou-se e ocupa o lugar
                                                                                                  Do útero
Lá, os filhotes cegos de ratos doentes
Ensaiam uma pequena farsa
Que nada mais é que a sua própria vida encenada por você & nós.

Minha exatidão de compostura ao te dizer bom dia no buraco negro que vende pães quentes.





Teu resmungar ecoando nas paredes surdas do meu lóbulo comprometido.

Sentir amor sem cessar nas quartas de agosto.


Senti amor sem cessar
Meus olhos cortados à navalha.
Senti amor sem cessar
Meus pulmões com mil litros de pus.
Senti amor sem cessar
O baço deslocado, a pele queimada, os tímpanos perfurados com pregos                 
                                                                                                         Vestidos de ferrugem
Senti amor sem cessar
Pela tua gangrena
Pelos músculos atrofiados
Pelo estiramento
Pelos ossos com rachaduras

Senti amor sem cessar
Escrevi uma carta com as fezes coloridas do doente terminal,
No guache perfumado de animais comestíveis
Atolei os dedos e te escrevi maldições autorizadas
Doces finais de vida, ecos do nosso coito cancerígeno.

Senti amor sem cessar
Porque o verde da sala me lembra de um crocodilo sem patas
As linhas amarelas me indicam o túmulo dos recém nascidos
Um pai morto, por acaso, recitando Stanislavski em Latim Vulgar
A mão de três dedos acariciando a atriz em coma.
Senti amor sem cessar

Senti amor sem cessar.
Senti amor sem cessar.
Senti amor sem cessar.

O executor


Troquei correspondências abstratas com um condenado
Que gostava de cães macios e queimaduras de terceiro grau
Ele me contou os segredos dos metros quadrados
E me mostrou a opacidade dos vidros transparentes

Me contou
Sobre o calor dos banhos frios
Do sabor da fome
mensurou a beleza das tatuagens infeccionadas

Troquei correspondências com um condenado.
Que tinha matado
Mas
Não tinha matado

Que tinha esquartejado
Mas
Que não tinha esquartejado

Que tinha atirado a esmo numa ciranda de crianças loucas
Mas
Que não tinha atirado a esmo numa ciranda de crianças loucas.

Que tinha matado pai, mãe, avós, filhos, netos, conhecidos, estranhos e um esquimó
Mas que
Nunca tinha matado e valorizava a vida
E acreditava em Deus
E orava pelo fim das guerras, pelo entendimento mútuo entre os Homens
Que queria o estado duplo
Que queria o fechamento de Guantánamo
Que tinha visitado o vaticano,
Feito doações ao Haiti
Cozinhado para os Somalis
Que tinha voltado no tempo, numa máquina devidamente licenciada e
E imobilizou Vidosav Blagojevic com técnicas de Krav Maga
E tinha dado de beber à cristo na cruz
E tinha podado a macieira
E libertado todos os escravos
E mediou a trégua com os anunnaki
E amou todos e tudo.

Eu troquei correspondências com um condenado
Que não havia sido condenado
Mas que foi eletrocutado
No dia do teu primeiro beijo
Do teu primeiro orgasmo

O nome dele é o teu primeiro poema
E seu corpo foi sepultado
Em cova rasa
Demarcada
por uma cicatriz
Na tua cara.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Os cascos com que ama.

Se dissermos, o que dissermos, o que diremos
Parados na mesma altura do subterrâneo
Confusos tal crânio & ciclano.
Certos de que o pescoço dela tem a mesma idade de cristo.
Se dissermos algo sobre a Rainha, o que dissermos
estará certo
e a nudez digestiva dela, após a missa
dirá tudo sobre
os cascos com que ama
o camponês.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

10 dicas para atores iniciantes.

1 Mantenha o canivete na coxia, a menos que a peça mencione um canivete.

2 Nenhuma saliva é demais.

3 Nunca bata o texto com pessoas incompatíveis com seu mapa astral.

4 Inverta o ritmo sempre que puder, se estiver lento, acelere, se estiver rápido, ralente.

5 Nenhuma nudez é gratuita, deixe de bobagens.

6 Aprenda sobre o mercado de ações, nunca venda imóveis de família, caminhe olhando para baixo, sempre atento a moedas e dinheiro perdido.

7 Quando lhe oferecerem comida, coma o máximo que puder.

8 Nunca convide parentes de primeiro grau para estreias.

9 Sempre que sentir vontade de criar uma performance, happening ou intervenção, contenha-se e leia Shakespeare ou Nelson Rodrigues (Caso você não entenda inglês).

10 Nunca receba, sóbrio, o público no camarim .

domingo, 7 de agosto de 2011

O último cigarro (do dia).




Fiquei parado alguns minutos na Avenida Paulista.
Passaram por mim muitos diálogos.
Em 4 ou 5 línguas diferentes (se não me engano, uma era língua morta)
O sol do inverno brincava de esconder os carros, o vão livre do Masp tomado por barracas com bandeiras Paulistas e brinquedos de gente morta.
Morreu muita gente essa semana. Gente próxima e gente indiferente, à favor e contra o vento.
Sentado ali, do lado de um ou dois outros colegas que não conheço, tentei sacar alguém que passava. Todos pareciam distantes e concentrados em sua caminhada de domingo.

sábado, 6 de agosto de 2011

Seu pai, aqui.

A chuva me sopra velhas canções de reverencia no ouvido.
Minha avó dança ali/aqui.
Seu pai está vindo em breve, ontem, ele virá.