terça-feira, 23 de agosto de 2011

O executor


Troquei correspondências abstratas com um condenado
Que gostava de cães macios e queimaduras de terceiro grau
Ele me contou os segredos dos metros quadrados
E me mostrou a opacidade dos vidros transparentes

Me contou
Sobre o calor dos banhos frios
Do sabor da fome
mensurou a beleza das tatuagens infeccionadas

Troquei correspondências com um condenado.
Que tinha matado
Mas
Não tinha matado

Que tinha esquartejado
Mas
Que não tinha esquartejado

Que tinha atirado a esmo numa ciranda de crianças loucas
Mas
Que não tinha atirado a esmo numa ciranda de crianças loucas.

Que tinha matado pai, mãe, avós, filhos, netos, conhecidos, estranhos e um esquimó
Mas que
Nunca tinha matado e valorizava a vida
E acreditava em Deus
E orava pelo fim das guerras, pelo entendimento mútuo entre os Homens
Que queria o estado duplo
Que queria o fechamento de Guantánamo
Que tinha visitado o vaticano,
Feito doações ao Haiti
Cozinhado para os Somalis
Que tinha voltado no tempo, numa máquina devidamente licenciada e
E imobilizou Vidosav Blagojevic com técnicas de Krav Maga
E tinha dado de beber à cristo na cruz
E tinha podado a macieira
E libertado todos os escravos
E mediou a trégua com os anunnaki
E amou todos e tudo.

Eu troquei correspondências com um condenado
Que não havia sido condenado
Mas que foi eletrocutado
No dia do teu primeiro beijo
Do teu primeiro orgasmo

O nome dele é o teu primeiro poema
E seu corpo foi sepultado
Em cova rasa
Demarcada
por uma cicatriz
Na tua cara.

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